quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Uma entrada no diário

Sinceramente, e desculpem-me esta impertinente sinceridade, hoje acordei mal. A boca sensaborona revelou-se seca, e os meus olhos reviraram-se mal se fizeram ouvir os primeiros rudes sons matinais. Escusado será dizer que acordei graças aos movimentos muitos suaves e serenos da minha irmã enquanto passeia, feliz, num domingo de manhã, pelo primeiro andar daquela a que chamamos nossa casa. Talvez o facto de ser domingo compusesse, um pouco, o acordar desenxabido e involuntário. Pus um pé no chão, de seguida, o outro e lá dei os primeiros passos coxos de dorida pelo sono. Posso, agora, afirmar que já me habituei à rotina para a qual acordei, pois detesto que me arranquem daquele mundo do sonho que corre como quisermos, mas que tem, infelizmente, duração limitada.
Mas não nos deixemos abater por causa disso. O dia mal começou e os livros, os cadernos pautados lisos esperam-me, para que sejam alimentados com os meus rabiscos errados de estudo.

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

O inoportuno

Escolhemo-lo sempre e entreolhamo-nos, arrependidos, devido ao silêncio mordaz que nos assombra. Detestamo-lo, talvez por que o inoportuno não é oportuno para se dizer algo, é oportuno para se estar calado. E caímos numa inconveniência desenxabida, em que não falamos, não dizemos nada e agimos como meros passageiros. Pessoas de passagem.
Não gosto muito dele, do inoportuno, afirmo desde já. É mais fácil estender-me nas graças da conveniência e ver o comboio a passar, lento. Se porventura mergulho no inoportuno enervantemente insuportável, afogo-me, porque não sei nadar em águas agitadas. É assim que me sinto. Por detrás de tal silêncio, deveras ensurdecedor (!), há uma voz que berra dentro de mim, uma voz de desespero. Uma voz que me diz para continuar, e não deixar a água entrar pela garganta adiante.

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

memória afortunada

Há algo que não controlo e que desejo arduamente. Não sei bem o que é, nem por onde anda, mas que me espia, espia!, e segue os meus passos de despercebida medrosa. Ainda não me atrevi a explorá-la melhor, quiçá por medo, por preguiça ou até por indiferença. No entanto, continuo a crer naquela força que me impulsiona para onde só eu sei e não me deixa – homessa! – pendurada, mas sim resgata-me como se eu fosse uma foragida ou desertora das guerras às quais não quero ir. Obrigada, memória.

quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

Não quero pensar


Pensar. Não o consigo fazer, por mais que alimente a pretensão caprichosa e má de tentar, porque o pensar leva-me para onde não quero, para o castigo, como aquele que temos de cumprir virados para a parede, sem puder ver o bom, o céu, o tudo. Pois é. Estou de castigo, e só me consigo renegar ao impedir o pensamento, o rumo da mente, já que não quero ir lá ter, nem pensar nem respirar, sequer. Todavia, se lá for parar, nem que seja por pequeníssimos instantes, fujo, com quanta coragem tiver em posse, e digo desde já, que não é muita. Eu e a coragem não somos compatíveis, e a compatibilidade também não é compatível comigo, ela não quer que eu me una, me sinta um só, e leva-me, guia-me para o castigo da solidão. Odeio-o.  Se bem que eu sempre o temi, e agora ainda o temo mais, pois se pudesse agarrar-me já ao meu cantinho, onde posso ser eu, somente eu, agarrar-me-ia com unhas e dentes, e amordaçava-me, para não pensar. E não penso. Vou fugir e acabrunhar-me e rebaixar-me.

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

Críticas


Uma crítica não me desmoraliza. Torna-me mais forte e, deixa-me cheia de medo, uma vez que cada palavra proferida atinge-me, soberba, como uma facada no coração. Talvez isso me enfraqueça o corpo, mas não aligeira a alma, pois esta permanece imutável, quer eu queira quer não. O sangue da facada no coração pode jorrar, fluido, líquido e até, porventura, estancar daqui a muito, muito tempo, mas o sangue que jorra da minha alma cai às pingas insignificantes, que só são dignas de cair quando algo  é realmente merecedor de dor.
Não me perfuraste a alma, não! Dá quantas facadas quiseres no meu corpinho franzino, até eu ficar morta e fria, no chão da vida, mas não me darás facadas na alma. Porque eu não deixo... Há alguém que me tapa os buraquinhos pequeninos, como eu, da minha alma. E, presta atenção, o que os tapa não são remendos paupérrimos, mais sim rígidos e firmes.
Talvez consigas arrancar uma linha da costura perfeita, mas não arrancas, juro que não, o remendo todo, porque quem o fez tem como princípio a convicção.

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

Para ti


Compreendo a distância, a separação. Mas não entendo a mágoa que nos causa; a angústia que se aprisiona no meu ser, pelos quilómetros que distam entre nós. Não são eles que comandam amizades imutáveis, como a nossa... Não são rotinas entediantes e diferentes, que dificultam, por si só, o que sinto por ti. E já que escrevo para ti, não sei bem o que escrever, porque o que vivemos foi apenas nosso, e foi indescritível. Inefável. Não que isso seja mau. Não o é. Não que isso seja um factor para chorarmos de saudade agarrados ao objecto que nos mais liga e para nos arrependermos das escolhas que fizemos. Não! Escolhemos, decidimos. Eu escolhi estar longe de ti, mas não permitirei que essa distância nefasta me afaste da proximidade outrora adquirida, que permanecerá eterna no tempo.

quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

Simplesmente dramático

É um drama, um drama ainda mais dramático aos quais estamos civicamente acostumados. Não suporto (ou talvez não simpatize) com a pretensão gulosa de "enfiarem" termos novos no nosso vocabulário,  tendo como desculpa o seu alargamento precioso, como se para sentir fosse preciso conhecer. De facto, nós sentimos, mas nem sempre conhecemos realmente o significado de tal sensação...  Dizem os peritos que é válido, é racional é inteligente incluir novos termos. Bem, meus caros, agora chocamos os dois?Hmm... Não, não sou racional, não sou inteligente. Sou eu.
E, quando estamos prestes a ser convencidos, desperta-se-nos um clique luminoso!, e deixámo-nos levar na onda paradisíaca e facilitista. Quem é que nos garante que seja tudo assim? Hoje em dia, não se cria uma sociedade inteligente, mas sim uma preguiçosa, mas convencida dos seus inexistentes dotes... Somos pais de uma sociedade banal, racional e não de uma emocional, que persegue os sonhos e não se deixa abater por algo que nos dizem e nos parece eticamente correcto. Falta-nos, a sério que nos falta, a essência, a assinatura pessoal. Mas já perdi a esperança, duvido que alguma vez consigamos ser nós próprios.

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

Apenas a aguardar

Há dias em que apenas aguardamos num silêncio profundo e de ansiedade, para que a sexta-feira tanto desejada chegue, pensando que no dia seguinte estaremos relaxados, e fortes e melhores. É mentira. É uma ilusão, não que esta seja má! Não. De todo. Mas convencemo-nos que o Sábado é bom, é diferente. Sim, é diferente.Aí sentimos o tão esperado toque de nostalgia, de fantasia, para o saborear, pedaço por pedaço na semana seguinte... Mas somos gulosos, somos? Em vez disso, preferimos comer tudo, e digerirmos a seco as migalhas a partir de quinta... Vá, hoje acabou-se a minha nostalgia. Vou roer qualquer coisa para ver se me aguento até sábado.

terça-feira, 3 de janeiro de 2012

Quando a tua voz se torna independente.

Penso por vezes que o vou perder. Não o quero deixar fugir por entre os dedos, mas se o fizer, correrei, veloz. É que a felicidade é indecifrável…Será que não posso decifrar metade dela com ele? Quero-o. Acho que até que nunca quis nada como esta pretensão que sinto em querê-lo… E se o perfume dele não perdurar no tempo que nos separa, se eu perder a imagem do seu corpo na mente…Perco-me também. Não podemos ser os dois perdidos, pelo menos, tenho perdê-lo próximo de mim. Só me questiono múltiplas vezes porquê. É certo que o tenho, que ele me tem, que o desejo, pois apesar desta ambição caprichosa de o ter só para mim, há a distância…Aí não somos caprichosos, não! Porquê, mais uma vez, tê-lo só para mim? A resposta é tão fácil e tão dura de pronunciar…A vergonha atinge-me, estrangula-me e não me deixar soltar um amo-te. Ela pode tornar-me afónica, muda, aliás…! Mas ela, maldita, não me amarra e prende os dedos, nem me esconde a caneta para escrever a mais bela palavra presente num mundo de ódio aparente.


segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

Carta nº indefinido...

Deus, sabes que oro sem rumo, sem propósito algum. Não que não goste de ti. Não que deteste usar esta anáfora de “nãos”, mas sim, Deus, porque não sei quem sou. Uma foragida, talvez. Renegada em recantos sombrios, escondidos por sombras convenientes e encoberta por nuvens escuras, nuvens de nada. Nada. Saber que sou nada já é, por si só, saber muito, saber algo sobre mim, pois de resto, não sei nada. E não gosto de mim, por usar demasiadas hipérboles, metáforas e outros recursos que embelezam disfarçadamente a minha forma impertinente de escrever. Deus, mas o que escrevo é para ti, e espero arduamente, por orações rasgadas de furor, que não te preocupes com sintaxe, erros de construção e pulcritude gramatical. Eu não o faço. Eu escrevo aquilo que sou, e sendo nada, não escrevo nada.